Os Amigos do Carro do Zé

 

            O Zé era camarada, um amigão para todas as horas, declaravam os que se diziam seus amigos.

 

            O Zé tinha um carro moderno, daqueles que chama a atenção por onde passa. Ele equipou a máquina, como gostava de chamar seu carro, com quase tudo o que tinha de dinheiro.

 

            Num mês era um som novo, no outro um DVD. Colocou direção hidráulica, chegou a trocar todo estofamento por bancos de couro legítimo. Dizia que seus amigos mereciam conforto e tudo o que ele tinha de melhor deveriam usufruir. Seu carro e seu amigos eram o melhor da sua vida, dizia ele.

 

            Com o carro podia reunir os amigos em viagens para a praia, para as festas, e era assim todo fim de semana.

 

            Certo dia dois amigos do Zé se encontram na rua:

 

            -- Oi Carlos! Será que o Zé empresta o carro para irmos à festa no sábado?

 

            -- Acho que não vai dar, Tonhão... O Zé bateu o carro, ou melhor, bateram no carro dele. Foi um caminhão desgovernado, dirigido por um motorista bêbado.

 

            -- Não posso acreditar! E estragou muito?

 

            -- Perda total. E o Zé nem fez seguro. Dizia que era melhor equipar o carro do que gastar dinheiro com um seguro.

 

            -- Mas e agora, como vamos fazer? E como vai ficar aquela viagem que marquei com minha garota e o Zé prometeu que me emprestaria o carro por quinze dias?

 

            -- Esquece. Não sobrou nada.

 

            -- Nadinha? Nem o som? Bom, é que o som o Zé podia colocar em um outro carro, podia vender e então compraria as passagens para o passeio da praia e iríamos de ônibus mesmo, fazer o quê?

 

            -- Nem o som, nem os bancos, nem os faróis de milha...

 

            -- Puxa vida, que azar o nosso, cara!

 

            -- Lembra Tonhão, aquela vez em que fomos no rodeio, com o carro do Zé? E ele amigão que é, entregou para nós o carro com o tanque cheio e um dinheirinho para o pedágio. Ele não pôde ir, tinha que fazer algumas horas extras para colocar insufilm nos vidros.

 

            E assim falaram por quase uma hora da tragédia que acometeu ao carro do Zé, e conseqüentemente também a eles, que perderam os passeios.

 

            Só esqueceram de lembrar  como estava o Zé, que naquele triste dia morreu e não tinha um amigo sequer no seu velório.

 

 

 

 

Sibele Ligório é contabilista, técnica em informática e acadêmica de Filosofia pela PUC - Campinas. É criadora do site Vida em Poesia.