A responsabilidade do escritor

 

 

O escritor, em sua mensagem, põe características culturais e ideológicas de sua época.

Nas várias formas de produção de textos é possível perceber se existem ou não características explícitas. Não é possível encontrar, por exemplo, em um texto científico, numa explicação técnica sobre o corpo humano, ou em um texto de lei, "informações" sobre seu autor como ser, se ele é sério ou brincalhão, se romântico ou não, nem mesmo é possível encontrar neles influência sobre o receptor, como causar emoções e reações.

Já num texto jornalístico, num poema, num romance ou numa propaganda, que são considerados pelo seu significado, as características podem tanto estar explicitas ou implícitas.

O escritor Severino Antônio Moreira Barbosa, definiu bem qual é o papel do escritor: "Quando escrevemos, estamos interpretando, estamos ‘lendo’ algum aspecto do mundo, dos outros, do eu no mundo, do eu nos outros e com os outros que vamos esboçando...".

Se um texto não-científico é marcado por características de quem o escreve, quem o lê pode dele ter várias interpretações, estabelecer diálogo com o autor ou com o personagem, considerando também suas circunstâncias. Assim é um texto polissêmico, pois surge o embate do autor que insere em sua produção um leitor oculto, aquele em que busca apoio para o que escreve e o leitor real, que de fato interpreta, assume ou refuta seu conteúdo. E assim é estabelecida a relação do autor/leitor/texto.

Nesta relação, não existem as possibilidades de pleno controle do significado, já que as interpretações do leitor não são limitadas, nem mesmo existe um leitor que compreenda as várias interpretações inseridas no texto, pois é possível que sejam diferentes o espaço e o tempo dela.

Em toda linguagem há sempre a presença de dois níveis semânticos. O primeiro nível exprime uma estrutura que fecha a realidade numa totalidade significativa, conclui um sentido da realidade, subordinado ao homem, por ele instaurado e manipulado. O segundo nível abre para um sentido indefinível, retraído. A linguagem é obra perfeita quando integra os dois níveis. (Introdução ao Pensar, Arcângelo Buzzi - 1978)

É necessário considerar na relação autor/texto/leitor esses diferentes níveis de linguagem. O autor na realidade escreve para um leitor já definido pela época, classe social e idade entre outras determinantes. É o autor que define quem será o leitor, assim, quem escreve também faz uma leitura sob algum aspecto específico.

Não existe mensagens sem intenções, quer sejam elas explícitas ou não. A interpretação dessas intenções pode ser captada pelo leitor de diversas formas. Pode o leitor admiti-las ou não, dialogar com o leitor imaginário instituído, ou contestá-lo.

No uso da linguagem de forma responsável, principalmente quando a intenção não é só a informação mas a persuasão, é necessário considerar o peso da interpretação para seu destinatário.

Ainda, é necessário pensar não somente na interpretação de um texto, mas de uma palavra, de um gesto ou expressão em determinada época ou momento. O autor é consciente dos sentidos implícitos e explícitos, e em qualquer forma de comunicação não cabe ingenuidade por parte do emissor, pois ele é consciente do que escreve e da influência que pode exercer.

 

 

 

Sibele Ligório é contabilista, técnica em informática e acadêmica de Filosofia pela PUC - Campinas. É criadora do site Vida em Poesia.